"Civilização em coma" in O Diabo
O europeu médio, domesticado pela educação igualitária e pela televisão anestesiante, perdeu qualquer sentido de tragédia, de sacrifício e pertença. A história reduziu-se à culpabilidade. Ser europeu hoje é um perpétuo pedido de desculpas, como se a própria existência da Europa e da sua civilização fossem um crime a ser expiado nos altares do multiculturalismo.
Toda e qualquer cultura pressupõe continuidade. Todavia a modernidade liberal-globalista não tolera nada que dure, aos seus olhos a tradição é um obstáculo, o património é uma violação e a literatura canónica é "racista". A arte clássica é, taxativamente, "colonial". O Ocidente de hoje está a ser reeducado como um prisioneiro político na China maoísta no sentido em que cada traço da sua identidade é reescrito, denegrido, quiçá expurgado.
A nova moral dominante, mascarada de compaixão, é a mais insidiosa forma de tirania. Vivemos na era da emotividade institucionalizada, onde a comoção substitui a razão, e o sofrimento, ou a encenação dele, legitima todas as políticas, por mais absurdas ou suicidas que sejam.
Se uma criança chora numa fronteira, devemos abrir as portas a milhões. Se alguém se sente ofendido por uma estátua, esta deve ser derrubada, independentemente do seu significado histórico. O sentimentalismo tornou-se o novo totalitarismo, na medida em que desarma qualquer resistência racional.
Guillaume Faye, com uma lucidez quase profética, escreveu: "a compaixão generalizada é o ópio da civilização em declínio." Não se trata de negar a piedade natural, que sempre foi uma virtude aristotélica, mas de combater o culto da fragilidade como instrumento político.
A crise da civilização europeia assenta numa trindade corrosiva, um altar profano onde a modernidade sacrifica tudo o que é nobre, orgânico e vertical. Este tripé (igualitarismo, economicismo e humanitarismo), sustenta o núcleo de uma ideologia que, disfarçada de progresso, trabalha activamente para dissolver as bases da ordem natural e cultural.
O Igualitarismo, esse dogma inquestionável, é a doença infantil do mundo moderno. A vida, por essência, é desigual, estruturada em hierarquias, em graus, em ordens. No entanto, o credo democrático contemporâneo já não se limita à igualdade jurídica; impõe agora uma igualdade ontológica: todos os povos são iguais, todas as culturas equivalentes e todas as escolhas de vida igualmente válidas.
Um mundo sem critérios é um mundo sem forma; e um mundo sem forma está condenado à desintegração entrópica.
A Economia, transformada numa religião laica, substituiu Deus, a Pátria e o destino. O neoliberalismo conseguiu aquilo que o marxismo tentou: submeter o homem à matéria. Não com violência, mas com conforto. Hoje já não somos cidadãos nem crentes, somos consumidores anónimos, perfis rastreados, algoritmizados, entretidos até à exaustão. Este homem novo, fraco, distraído e disponível, é o ideal da sociedade de mercado: dócil e descartável.
O Humanitarismo, por fim, é a mais cínica das armas. Em nome da compaixão, instaurou-se um mecanismo sistemático de erosão civilizacional. Já não se invocam os "direitos humanos" para proteger, antes para substituir. Abrem-se fronteiras, apagam-se as identidades e reescreve-se a história com tinta de culpa. O europeu é agora carcereiro da sua própria memória e cúmplice passivo da sua extinção demográfica.
Filipe Carvalho